quinta-feira, 9 de outubro de 2008

O teatro popular e a censura

Grupo de teatro popular que sofreu com censura em 1968 abre Seminário com encenação

O grupo Teatro Popular União e Olho Vivo irá apresentar, no dia 12 de outubro, a peça A Lenda de Sepé Tiaraju. A encenação abrirá o Seminário 1968: Liberdade e Repressão, organizado pelo Arquivo Miroel Silveira, da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, ECA-USP.

A peça conta a história do índio Sepé Tiaraju, um dos vários guaranis julgados à época do Brasil Colonial por terem desrespeitado o acordo luso-espanhol de abandonarem suas casas e cederem aos colonizadores das missões jesuíticas.

Essa encenação insere-se no âmbito das atividades do Seminário, que pretende promover reflexões e debates acerca do conturbado ano de 1968, cujos conflitos e contradições culminaram, no Brasil, com a promulgação do Ato Institucional nº 5, que endureceu ainda mais a perseguição durante o Regime Militar.

O grupo TUOV sofreu com a censura e a repressão na época pelo fato de ser um teatro popular que destacava a cultura popular, cujas idéias desagradavam uma elite hipócrita e iludida com uma sociedade "branca" e sem problemas, ao molde do exterior.


Nesse sentido, as artes sofreram com a repressão intelectual e ideológica promovida pela Ditadura que as via como uma fonte perigosa de comunicação, de deciframento do código social, o que levava à reflexão, ao pensamento, à produção de conhecimento e a uma visão crítica da sociedade. Desse modo, a censura procurava coibir, intimidar, dificultar essa comunicação entre o conhecimento e o povo.

O teatro no Brasil, desde o final dos anos 50, começara a busca por uma identidade nacional, uma arte que refletisse os anseios do povo brasileiro e não falseasse suas idéias a partir do consumo do que vinha de fora. O Teatro de Arena foi o pioneiro nesse sentido, inserindo temas brasileiros nas peças e colocando uma parcela da sociedade que a elite queria esconder: o índio, o negro, o pobre. Foi seguido pelo Opinião e pelo Oficina.

O TUOV nasceu em plena Ditadura Militar (1966) e, contrariando a lógica, já que a repressão foi intensa a partir de 1968, resistiu à censura, permanecendo em pleno funcionamento até os dias de hoje.

Se a grande dor de cabeça do Arena foi como se tornar, de fato, um teatro popular, visto que integrantes do teatro à época, em especial Vianinha, se auto-criticavam dizendo que apesar de todo o esforço do grupo de promover uma reflexão da sociedade brasileira e de criar contato com o povo, o pequeno teatro da Teodoro Baima não conseguia dar conta desse contato de maneira efetiva, o TUOV conseguirá efetivar esse contato com o povo, fazendo disso sua característica mais marcante.

Desde sua estréia, manteve a idéia de colocar a cultura brasileira no palco (o carnaval, as tradições regionais, o futebol, a literatura de cordel, o bumba-meu-boi), mas procurou também levar essa cultura até quem a produz, ou a quem, por desigualdades que envolvem aspectos socioeconômicos, não tem acesso a ela.

O TUOV, até hoje, leva sua arte até a periferia paulistana e as comunidades carentes da Grande São Paulo. E com isso consegue cumprir seu papel de teatro não profissional que vai até setores sociais que, historicamente, não têm acesso à produção cultural.

A Lenda de Sepé Tiaraju, que promove uma reflexão acerca da colonização brasileira, é produto fiel de um teatro que nasceu no bojo da Ditadura e colocava o povo no palco, sem medo. È um filho legítimo de teatro popular.

A Lenda de Sepé Tiaraju
Dia 12 de outubro, às 17h.
Rua Newton Prado, 766. - Bom Retiro. Teatro União e Olho Vivo