segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Autora, atriz e pesquisadora se encontram para falar da censura

Na segunda mesa de terça-feira, três mulheres do teatro brasileiro se encontraram para debater os significados da censura


A segunda mesa do dia, “Esta noite falamos de medo”, foi formada por três mulheres, personagens-chave da história do teatro brasileiro moderno: Nydia Lícia, atriz do TBC (Teatro Brasileiro de Comédia) e fundadora da Companhia Nydia Lícia; Maria Thereza Vargas, grande pesquisadora do teatro brasileiro; e Renata Pallottini, dramaturga, cuja peça “O Crime da Cabra”, seria encenada mais tarde, no mesmo dia de evento.


“A censura era burra!”

Muito irreverente, a atriz Nydia Lícia não poupou palavras para dizer o que pensa da censura. “Naquela época, ninguém conseguia se livrar da censura. Mas ela era burra, completamente idiota!”, afirmou, arrancando risos da platéia.


Ela contou a história de sua peça como autora, “Essa Noite Falamos de Medo” (presente no Arquivo Miroel Silveira). A peça, conta, falava de nazismo, bomba atômica, racismo nos Estados Unidos, entre outros temas. E ela, na época, foi chamada na delegacia para dar explicações sobre a peça, “o porquê de ser contra os Estados Unidos”, falar de Marx, etc.


Descontraída, a atriz conta que havia muitas peças ruins. E brinca ao dizer que às vezes era até bom que elas fossem censuradas, de tão ruins. “Eram tão ruins que não eram nem encenadas quando eram posteriormente liberadas”.


Solidariedade foi fundamental


Maria Thereza Vargas, que por ter presenciado décadas de acontecimento no teatro brasileiro moderno e, ao mesmo tempo, tê-lo estudado, faz parte de toda essa história, conta que a solidariedade entre a classe teatral foi essencial para que a resistência do teatro contra a censura fosse efetiva.


Para a pesquisadora, a fidelidade à vocação mostrou para os censores com quem eles estavam lhe dando. Se, precipitadamente, os censores agiam como se estivessem diante de pessoas sem capacidade de auto-defesa, logo percebiam que se tratava de uma classe, muito bem organizada e que tinha força. A categoria foi humilhada, diz, mas resistiu. Humilhada porque centenas de textos foram censurados na estréia, o que causava problemas sérios para o grupo (na maioria financeiros).


Aliás, com Nydia Lícia presente na mesa, não havia hora mais oportuna para lembrar que o TBC foi o principal responsável por profissionalizar o teatro no Brasil.


Maria Thereza faz uma ressalva: hoje, apesar da seriedade com o qual se trata da censura, há um pouco de folclore, o que mistifica aqueles fatos. “Mas a coisa sempre foi séria”, comenta.


“A classe teatral foi heróica”

Renata Pallottini continuou com as reflexões sobre a censura ao teatro. Concordou com a fala de sua amiga Nydia Lícia, ao dizer que a censura não fazia nenhum exercício intelectual durante o processo de análise e censura da peça.


Ela conta que eles eram funcionários a partir dos anos 50, e sentiam a pressão do trabalho, tinham que fazer algo que justificasse o salário. “Os censores tinham muitas vezes que ‘procurar chifre em cabeça de cavalo’”, comenta.


Para a autora, a classe teatral foi heróica por resistir à censura. “É uma luta que não se pode esquecer”, completa. Ela ainda disse que a censura, de diferentes modos, persiste até hoje, que é preciso estar sempre alerta para a defesa da liberdade.

Nenhum comentário: